Às vezes me sinto tão triste que parece que tudo
fora de mim é mais vivo. Fico perdido, confuso... não sei? Não. Não vou ter
nenhuma crise existencial: até por que consigo resolver meus problemas
existencialistas com algumas doses de uísque (15 anos bem resolvidos). A
tristeza que sinto é oca, sem sentido. Parece que alguma coisa fica mordendo
meu trilho. A tristeza é humana e, na medida do possível tento escapar dessa
fera lépida que me atormenta continuamente. Leio, releio nas entrelinhas da
vida encontrando sempre respostas que já sei, busquei aos poucos soluções nos
loucos, nos sem compromisso, mas eles já não tinham o que dizer sobre a
tristeza. A verdade é que todos sabem que o mundo tem uma infinidade de
problemas muito piores do que essa minha tristeza, mas tento justificar o
injustificável. Existe no mundo uma tristeza das mães, dos filhos, dos animais,
“objetos”, estrelas, mar, céu... Essa tristeza dói tanto que ela acaba se
tornando uma tristeza coletiva. Tenho a impressão que essa tristeza chegue numa
frequência menor em mim (microscópica), talvez, a tristeza foi aos poucos sendo
metamorfoseada em meu corpo. A tristeza é como uma fúria no meu deserto. Minha
tristeza, vossa tristeza, todas as tristezas que sentimos é algum estilhaço do
mundo. A arte é na sua essência triste e simplória, assim como a vida. Essa
tristeza que sinto é necessária para minha sobrevivência, mas bem que ela poderia
vir menos mexer com a minha índole. No dicionário diz-se que tristeza é: falta
de alegria, esmorecimento, desânimo, abatimento, melancolia. Não quero dizer
que o seu Aurélio esteja errado, mas tristeza é o estado natural das coisas. O
ser humano colocou tristeza na sua genealogia. A tristeza já existia muito
antes do big bang, neologismo ignóbil de fazeres desconhecidos, parônima
selvagem. Como se diz a palavra tristeza em alemão? Agora como se diz tristeza
de forma universal? Ninguém quer responder. Acabo este texto no meio da rua
enquanto vejo um homem cair do nada na calçada, meia dúzia corre para
socorrê-lo. Chego devagar, e logo, reconheço que se tratava de um AVC. Ligo
para ambulância dou todas as coordenadas.
Resolvido. Pego o ônibus. Já em
casa... Descubro que não, não existe tristeza mais triste que o fardo de viver.
O cotidiano é quem nos deixa triste, repetitivamente tristes. Somos e seremos
tristes algum dia e não ligaremos mais para isso. Quem sabe, se não estivesse
tão triste teria ficado com o homem até a chegada de sua morte no leito do
hospital, mas a tristeza certas vezes não perdoa ninguém que cruza seu caminho.
As ruas silenciam. Vou dormir.
“A arte existe porque a vida não basta.”
Ferreira Gullar acertou na artéria do corpo mundo
com essa frase. A arte ela é onisciente quando o assunto necessita de ir além.
Tenho que confessar: a arte foi uma maldição que jogaram em mim, mas dentro
dessa loucura que chamam de vida, não sei o que seria de mim sem ela. Lembro o
meu primeiro choque com Dickens, Godard, Kubrick, Hemingway, Truffaut, Victor
Hugo, Greenaway, Dostoievski, José Alcides Pinto, Allan Poe, Moreira Campos,
Fernando Sabino, Gorki, Faulkner, Kafka (até hoje sonho me transformando,
saindo de uma casca). Depois veio a poesia e um interesse maior pela música. A
arte serve para sairmos da casca de nós mesmos. Doutrina totalmente kafkiana.
Na arte tudo se transforma ou se torna uma transformação. Foi necessário que
escutasse muito Bob Dylan para entender as pedras que rolam. Bebido por muitas
horas para lembrar os caminhos de Zaratustra. O poder que arte tem de criar uma
nova perspectiva é simples: basta você ter uma mente aberta, ou então, tenha
sempre um pé de cabra para abri-la. O artista no geral, ganha o interesse para
produzir arte quando sente falta de repostas que ele daria. O universo das
respostas é estreito. Sobre os dilemas que viciam o ser humano e o mundo temos
essa pergunta primaria que a humanidade vai levando até seu perecer. Esse
questionamento é quase mítico dentro de um pensamento não científico, mas esses
círculos de pensamentos continuam e continuará sendo o gatilho para o
livramento metafísico da vida. Tento me
imaginar com um livro escrito por mim resolvendo os problemas do meu eu de
dezesseis anos. As minhas escolhas e minhas perguntas foram desfiguradas pelo
tempo, porém, não tive muitas decepções amorosas para criar aquele ego ultra
narcisista; havia nascido maduro, perdido o caminhar da minha juventude,
abandonado o meu cordão umbilical lá no sertão (quem saiba daí aquela tristeza),
enfim, mudei tanto o meu caminhar que no fim, a melhor reposta que daria para o
meu eu de dezesseis anos seria para não escutar essa filha da puta do futuro.
Com meus dezesseis anos pensava em ser Sartre fundido num trapalhão (Muçum),
logo depois quando li Salinger queria fuder com o mundo com meus gritos
misantrópicos, punks cheios da minha virtuose. Com o tempo entendi como a arte
mexeu comigo. A arte me deixou meio ranzinza, pessimista, anárquico, me levou a
lugares estranhamos e desconhecidos, mas deu total liberdade para discordar de
suas intenções. Toda arte que já consumi me basta, dentro de um contexto: a
falta do excesso é o que torna a perfeição absoluta e, como um artista medíocre
que sou eu me autoavalio. Parem! Eu confesso: sou um sujeito sem jeito que tem
lá seu valor quando consegue organizar seus erros. Parem! Confesso: toda noite
que morre, a arte é quem me socorre. E se a vida imita a arte? Eu consumo a
arte, mas a vida é quem me consome, então, a arte é a vida? O certo é que o fim
é o principio “a arte existe porque a vida não basta.”
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