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quinta-feira, 23 de abril de 2015

Tristeza


Às vezes me sinto tão triste que parece que tudo fora de mim é mais vivo. Fico perdido, confuso... não sei? Não. Não vou ter nenhuma crise existencial: até por que consigo resolver meus problemas existencialistas com algumas doses de uísque (15 anos bem resolvidos). A tristeza que sinto é oca, sem sentido. Parece que alguma coisa fica mordendo meu trilho. A tristeza é humana e, na medida do possível tento escapar dessa fera lépida que me atormenta continuamente. Leio, releio nas entrelinhas da vida encontrando sempre respostas que já sei, busquei aos poucos soluções nos loucos, nos sem compromisso, mas eles já não tinham o que dizer sobre a tristeza. A verdade é que todos sabem que o mundo tem uma infinidade de problemas muito piores do que essa minha tristeza, mas tento justificar o injustificável. Existe no mundo uma tristeza das mães, dos filhos, dos animais, “objetos”, estrelas, mar, céu... Essa tristeza dói tanto que ela acaba se tornando uma tristeza coletiva. Tenho a impressão que essa tristeza chegue numa frequência menor em mim (microscópica), talvez, a tristeza foi aos poucos sendo metamorfoseada em meu corpo. A tristeza é como uma fúria no meu deserto. Minha tristeza, vossa tristeza, todas as tristezas que sentimos é algum estilhaço do mundo. A arte é na sua essência triste e simplória, assim como a vida. Essa tristeza que sinto é necessária para minha sobrevivência, mas bem que ela poderia vir menos mexer com a minha índole. No dicionário diz-se que tristeza é: falta de alegria, esmorecimento, desânimo, abatimento, melancolia. Não quero dizer que o seu Aurélio esteja errado, mas tristeza é o estado natural das coisas. O ser humano colocou tristeza na sua genealogia. A tristeza já existia muito antes do big bang, neologismo ignóbil de fazeres desconhecidos, parônima selvagem. Como se diz a palavra tristeza em alemão? Agora como se diz tristeza de forma universal? Ninguém quer responder. Acabo este texto no meio da rua enquanto vejo um homem cair do nada na calçada, meia dúzia corre para socorrê-lo. Chego devagar, e logo, reconheço que se tratava de um AVC. Ligo para ambulância dou todas as coordenadas.  Resolvido. Pego o ônibus.  Já em casa... Descubro que não, não existe tristeza mais triste que o fardo de viver. O cotidiano é quem nos deixa triste, repetitivamente tristes. Somos e seremos tristes algum dia e não ligaremos mais para isso. Quem sabe, se não estivesse tão triste teria ficado com o homem até a chegada de sua morte no leito do hospital, mas a tristeza certas vezes não perdoa ninguém que cruza seu caminho. As ruas silenciam. Vou dormir. 

“A arte existe porque a vida não basta.”

Ferreira Gullar acertou na artéria do corpo mundo com essa frase. A arte ela é onisciente quando o assunto necessita de ir além. Tenho que confessar: a arte foi uma maldição que jogaram em mim, mas dentro dessa loucura que chamam de vida, não sei o que seria de mim sem ela. Lembro o meu primeiro choque com Dickens, Godard, Kubrick, Hemingway, Truffaut, Victor Hugo, Greenaway, Dostoievski, José Alcides Pinto, Allan Poe, Moreira Campos, Fernando Sabino, Gorki, Faulkner, Kafka (até hoje sonho me transformando, saindo de uma casca). Depois veio a poesia e um interesse maior pela música. A arte serve para sairmos da casca de nós mesmos. Doutrina totalmente kafkiana. Na arte tudo se transforma ou se torna uma transformação. Foi necessário que escutasse muito Bob Dylan para entender as pedras que rolam. Bebido por muitas horas para lembrar os caminhos de Zaratustra. O poder que arte tem de criar uma nova perspectiva é simples: basta você ter uma mente aberta, ou então, tenha sempre um pé de cabra para abri-la. O artista no geral, ganha o interesse para produzir arte quando sente falta de repostas que ele daria. O universo das respostas é estreito. Sobre os dilemas que viciam o ser humano e o mundo temos essa pergunta primaria que a humanidade vai levando até seu perecer. Esse questionamento é quase mítico dentro de um pensamento não científico, mas esses círculos de pensamentos continuam e continuará sendo o gatilho para o livramento metafísico da vida.  Tento me imaginar com um livro escrito por mim resolvendo os problemas do meu eu de dezesseis anos. As minhas escolhas e minhas perguntas foram desfiguradas pelo tempo, porém, não tive muitas decepções amorosas para criar aquele ego ultra narcisista; havia nascido maduro, perdido o caminhar da minha juventude, abandonado o meu cordão umbilical lá no sertão (quem saiba daí aquela tristeza), enfim, mudei tanto o meu caminhar que no fim, a melhor reposta que daria para o meu eu de dezesseis anos seria para não escutar essa filha da puta do futuro. Com meus dezesseis anos pensava em ser Sartre fundido num trapalhão (Muçum), logo depois quando li Salinger queria fuder com o mundo com meus gritos misantrópicos, punks cheios da minha virtuose. Com o tempo entendi como a arte mexeu comigo. A arte me deixou meio ranzinza, pessimista, anárquico, me levou a lugares estranhamos e desconhecidos, mas deu total liberdade para discordar de suas intenções. Toda arte que já consumi me basta, dentro de um contexto: a falta do excesso é o que torna a perfeição absoluta e, como um artista medíocre que sou eu me autoavalio. Parem! Eu confesso: sou um sujeito sem jeito que tem lá seu valor quando consegue organizar seus erros. Parem! Confesso: toda noite que morre, a arte é quem me socorre. E se a vida imita a arte? Eu consumo a arte, mas a vida é quem me consome, então, a arte é a vida? O certo é que o fim é o principio “a arte existe porque a vida não basta.”

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