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quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Carolina Maria de Jesus

Olá. Sou a Maria Ferreira do blog Minhas Impressões e uma vez por mês estarei aqui trazendo alguma coisa para vocês. Esse mês de janeiro quase não sai porque eu não fazia a menor ideia do que escrever,  mas o Raphael é uma cara legal e me deu total liberdade. Desse modo, inauguro o meu espaço com uma postagem sobre Carolina Maria de Jesus, porque ela é pouco conhecida e divulgada, mas as pessoas costumam se surpreender quando têm contato com a obra dela.


Carolina Maria de Jesus nasceu em 1914, na cidade de Sacramento, estado de Minas Gerais. Onde viveu até 1947, quando migrou para São Paulo em busca de melhores condições de vida. Chegando aqui, foi morar na zona norte da cidade, na extinta favela do Canidé, onde construiu sua própria casa usando papelão, madeira e lata.
Inicialmente, trabalhou como empregada doméstica e por não se adaptar a esse trabalho, passou a ser catadora de papel. Em cadernos que encontrou no lixo, começou a escrever como eram seus dias, a rotina na favela em que morava, em forma de diário.
Foi mãe solteira de três crianças: João José, José Carlos e Vera Eunice. 
"Como é horrível ver um filho comer e perguntar: 'Tem mais?' Esta palavra 'tem mais' fica oscilando dentro do cérebro de uma mãe que olha as panelas e não tem mais".
 "Que suplício catar papel ultimamente! Tenho que levar a minha filha Vera Eunice. Ela está com dois anos, e não gosta de ficar em casa. Eu ponho o saco na cabeça e a levo nos braços. Suporto o peso do saco na cabeça e suporto o peso da Vera Eunice nos braços. Tem hora que me revolto. Depois me domino. Ela não tem culpa de estar no mundo".
Em 1958, foi descoberta pelo jornalista Audálio Dantas e em 1960 teve seu livro, "Quarto de despejo: diário de uma favelada" publicado. Dizer que foi um sucesso é pouco, o livro teve grande repercussão nacional e internacionalmente. A tiragem inicial de dez mil exemplares se esgotou na primeira semana, foi editado oito vezes no mesmo ano e atualmente se encontra traduzido para mais de treze idiomas. E apesar de tudo isso, que é impressionante, hoje em dia, pouco se ouve e se sabe sobre Carolina. E qual o motivo disso? Não é interessante para as elites que as pessoas fiquem sabem de umas verdades, fiquem sabendo que o descaso social é muito grande e pouco é feito para erradicá-lo.
''O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no próximo,e nas crianças".
Carolina, mulher negra, pobre, da favela, foi um tapa na cara daquela sociedade dominada por autores brancos de classe média. Sua escrita incomodou muita gente e continua incomodando, por isso ela é tão pouco conhecida atualmente, pelo menos no Brasil.
"O mundo das aves deve ser melhor do que dos favelados, que deitam e não dormem porque se deitam sem comer".

Com o sucesso que obteu na época, Carolina comprou uma casa de alvenaria no bairro Alto de Santana e passou a ser convidada para dar palestras em faculdades, em outros estados. Foi aclamada pela crítica e todos queriam conhecer essa mulher, pouco instruída que estava fazendo tanto sucesso. Mas quando morreu em 1977, Carolina já tinha caído no esquecimento e poucas pessoas compareceram em seu enterro.
"Os meninos come muito pão. Eles gostam de pão mole. Mas quando não tem eles comem pão duro. Duro é o que pão que nós comemos. Dura é a cama que dormimos. Dura é a vida que do favelado".
Ano passado foi comemorado o seu centenário e em diversas cidades, principalmente aqui em São paulo, foram realizados diversos eventos em homenagem à Carolina. Eventos nos quais, Vera Eunice, filha de Carolina, esteve presente.
Aqui em São Paulo, a biblioteca do Museu Afro-Brasil foi batizada com o nome dela e seu acervo conta com seus livros que foram traduzidos para outros idiomas.
 ''Será que Deus vai ter pena de mim? Será que eu arranjo dinheiro hoje? será que Deus sabe que existe as favelas e que os favelados passam fome?"


terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Birdman or (The Unexpected Virtue of Ignorance) [Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)] - Alejandro G. Iñárritu [2014]

Vejam só, consegui cumprir minha promessa de resenhar os filmes do Oscar antes da premiação pelo menos com um dos filmes, agora faltam todos os outros. Esse, pra falar a verdade, tem sido meu favorito pra ganhar a maior parte dos prêmios desde o início (lembrando a vocês que haverá previsão esse ano também). Nas categorias principais, imagino que não haverá muita surpresa, a não ser que os outros concorrentes sejam muito surpreendentes (e devo dizer, com o risco de parecer um babaca após a premiação, que não parece ser esse o caso). Mas não estou aqui só pra elogiar, estou aqui pra explicar.


Decadente, definido por uma carreira cinematográfica medíocre e preso a um personagem esquecido, Riggan (Michael Keaton) quer ser levado a sério e, para tanto, decide produzir uma montagem teatral de "Do que falamos quando falamos de amor", um conto aclamado do Raymond Carver. Essa montagem envolve a relação de Riggan com os outros atores, incluindo um porra-louca nos palcos mas brocha na vida ator pretensioso que quer roubar o holofote e pode muito bem ter o talento para tal Mike (Edward Norton), e a atriz fazendo sua estreia na Broadway e realizando um sonho Lesley (Naomi Watts), seu co-produtor e amigo Jake (Zach Galifianakis), sua filha drogada (Emma Stone), sua ex-esposa, sua atual namorada (que também é atriz na peça), os críticos, os jornalistas, o público e o seu próprio passado. Birdman, então, é esse momento da vida de todas essas pessoas.


Vai ser muito fácil eu me perder nos elogios, então deixa eu tomar cuidado aqui e decidir por onde eu quero começar. Vamos ao elenco, que é o mais óbvio. Cheguei a me preocupar quando vi a quantidade de nomes, grandes, iniciantes e esquecidos nesse filme. Por um lado foi bom, me ajudou a refrear minhas expectativas. Cada um dos personagens, principais e secundários, executam seus papéis com perfeição. Claro, uns chamam mais atenção que outros, mas ainda assim, não tem nada fora do lugar. Michael Keaton principalmente. Não acho que alguém no mundo se lembrava do que ele era capaz de fazer como ator, mesmo esse papel sendo mais ou menos como a vida dele (ele foi, afinal, o Batman, lembram?, muito antes do Christian Bale. E nem foi ruim aquele primeiro filme, melhor que Dark Knight Rises, mas isso é outra história). Ele foi o Batman, fez uma série de decisões ruins na vida e ninguém mais o levava a sério, até que ele fez Birdman e agora é favorito ao Oscar, quem diria?


Tecnicamente falando, é impossível ignorar o artifício da edição, que fez o filme todo parecer um take só. Mesmo não sendo - e sendo possível fazer filmes em um take só, vide Arca Russa (Sokurov) -, ainda é muito impressionante. Não é só um jogo vazio, no entanto. A ideia é trazer ao espectador o mesmo senso de imediatismo de uma peça de teatro, essa que nunca tem cortes depois que começa, além de aumentar e muito o grau de imersão - o que é importante em um filme que se passa, em parte, na cabeça doente de seus personagens, principalmente na de Riggan. 


 Falando em cabeça doente, eis outra brincadeira do filme. O que é realidade e o que não é? No começo, a resposta parece bem clara, mas, conforme o tempo passa e a situação de Riggan se agrava, mas tênue é a linha que separa a alucinação do real. Isso também é usado para criticar a cultura de massa de forma nada sutil, vide a cena em que Birdman aparece e pede ao Riggan para dar ao público aquilo que eles querem (ação, explosões, CG, super-heróis etc.). Fiquei na dúvida por um tempo se eu achava que a falta de sutileza nisso era um defeito ou não, afinal de contas o discurso contra o "mainstream" já tá mais do que batido e deu o que tinha que dar. Por outro lado, tem algo de fresco na forma que esse discurso se dá em Birdman. É pelo ponto de vista de um ator que foi o mainstream (no filme e na vida real) e está tentando fazer a transição para a chamada "alta cultura" e não sendo bem visto por isso, mostrando que não adianta, ninguém nunca está satisfeito. Isso fica mais óbvio quando Riggan se vê entre o público e conhece a cultura da internet. Pode parecer muita informação que eu estou dando aqui, mas acho que estou sendo vago o bastante. Vou parar por aqui, de qualquer forma, só para garantir que não vá ter choradeira mais tarde por spoilers (como se isso acontecesse por aqui...as pessoas não vêm no meu blog nem pra falar mal).


É tudo tão perfeito, medido e exato em Birdman, pra que o truque da edição funcione, que até a trilha sonora - nada além de um solo de bateria de jazz - é sincronizado com a história. Seja quando um baterista aparece mesmo na rua, aparentemente tocando o mesmo solo do filme, seja quando o Riggan dá um tapa na porta ao mesmo tempo que o músico bate no prato da bateria (se isso não render um Oscar de edição de som, não sei o que renderá). O filme é um relógio pontualíssimo, que mesmo assim não perde a naturalidade. E por isso se tornou meu favorito esse ano para as premiações. Se eu estarei certo ou não, se eu vou mudar de ideia amanhã ou não, não me importa. Não sou muito de me responsabilizar pelas minhas afirmações. Uma coisa eu tenho certeza, indico o filme.

Nota: 5/5

domingo, 18 de janeiro de 2015

Momento Musical #7 - John Coltrane





O momento musical de hoje trás apenas um músico, mas um que sozinho vale por três ou quatro. Nos EUA foi fundada uma igreja em homenagem a ele e às qualidades transcendentais de suas músicas. Ele próprio tendo composto o disco A Love Supreme como uma oração dividida em quatro partes, baseada em um poema de louvor que ele escreveu, sendo cada nota uma sílaba, até a música estourar em um surto de improviso.

John Coltrane é o nome do jazz que todos, quando iniciados no gênero, logo aprendem. Tocou no quinteto do Miles Davis - outro cidadão que dará as caras por aqui logo mais - até ser expulso por seus excessos, principalmente com heroína (e quando Miles Davis acha que você usa muita heroína, é porque é muita heroína). Conseguiu se reabilitar, trocando a droga pelo LSD, que mudou totalmente sua forma de compor a partir do meio da década de 60 (fim da vida). A aparente falta de sentido das composições afastou até os membros mais fieis de sua banda, como McCoy Tyner, mas atraiu gente da vanguarda como Pharoah Sanders, Ornette Coleman, sendo esses os primeiros passos mais firmes do chamado free jazz - que já existia antes, só foi levado ao extremo. É seguro dizer que Coltrane passou pela maior parte das variações do jazz e tocou com todos os grandes nomes de seu tempo (Duke Ellington, Thelonious Monk, Bill Evans, Cannonball Aderley etc.). Morreu em 67 de problemas de saúde possivelmente originados pelo abuso de heroína, e, desde então, se tornou uma lenda da música, não sem motivo.

Nessa ordem: Coltrane, Cannonball Aderley, Miles Davis e o sempre sério Bill Evans.


Por esses e outros motivos, a postagem de hoje se dedica somente aos discos dele. Porque eu acredito que é possível passar toda uma vida ouvindo apenas Coltrane, sem compreender todos os detalhes do estilo dele. Divirtam-se, crianças.







terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Um crime delicado - Sérgio Sant'anna [1997]


"É preciso esclarecer que, na primeira vez em que a vi, ela estava sentada à mesa no Café e eu não podia observá-la de corpo inteiro, embora concluísse, por seu rosto de traços finos e delicados - e pelos seios pouco salientes, assim à primeira vista, dentro de uma blusa graciosa -, que era uma mulher magra, com o corpo bem-proporcionado. Mas foi principalmente o rosto que me atraiu, os cabelos claros, encaracolados, o que me fez pensar, talvez ajudado por duas doses de conhaque, numa princesa russa." (p. 9 - primeira frase do livro, pra ser exato, já deixando claro o tom da história.)

Para o crítico de teatro Antônio Martins, não haveria motivo para que ele visse Inês, a moça que ele observava no Café, novamente, apesar daquela atração repentina que ele sentiu. No entanto eles voltam a se esbarrar no metrô e ele descobre que ela é manca. Aos poucos ele se vê obcecado por ela e formam um relacionamento afetivo próximo à perversão (como é tão comum nas histórias do Sérgio - depois de cinco livros lidos, posso chamar de Sérgio?). Ele tenta, com trabalho e outras mulheres, deixar Inês de lado, mas segue a encontrando, mesmo quando não a procura, por coincidência, assim ele acredita. O crime, em si, pode ter sido parte de um plano do artista plástico Vitório Brancatti, de quem Inês serve de modelo. Assim Antônio entende ou quer que o leitor entenda.

Eu devo ser, entre os críticos amadores da internet, o maior divulgador do Sérgio Sant'anna. Três resenhas feitas (contando com essa), duas por fazer, e estou lendo o livro mais recente dele, Homem-Mulher, para poder escrever a sexta. Acho que ele é meu favorito entre os nacionais, ao menos está chegando lá aos poucos. Esse foi o primeiro romance propriamente dito que eu li dele. Antes disso só dezenas de contos, três novelas e uma peça de teatro, tudo da mais alta qualidade. Não sabia o que esperar dele nesse formato, mas, felizmente, não tive surpresas. É tão bom quanto todo o resto.

"A mostra justificava o seu nome. As obras, quase todas, divergiam - e não apenas pelo seu suporte - não só dos melhores valores e tendências contemporâneos, apesar de ser difícil detectar tendências ou valores nítidos neste final de século, ao contrário de seu princípio, como divergiam muito entre si. Fiquei pensando se os expositores não haveriam se unido sob aquele rótulo apenas por terem sido rejeitados pelo mercado, galerias e salões." (pp. 52 e 53)

Agora chega de puxar saco e vamos ao que interessa. O que mais impressiona num livro do Sérgio Sant'anna é a variação da linguagem. Ela fica mais notável nas coletâneas de contos, afinal o número de textos é maior, mas mesmo aqui isso dá seu sinal. Primeiro que o Sérgio domina o lado ator que faz parte do ofício de escritor. Quem escreveu esse livro foi Antônio Martins, o crítico fictício, ninguém mais ninguém menos. Isso se reflete na linguagem formal, próxima ao erudito, mas não fugindo do popular. Está incluso também nas críticas que se misturam a narrativa. Afinal, não é porque ele faz parte de um enredo de romance que ele não tem que trabalhar. Está na força analítica da observação.

É um romance curto, 132 páginas divididas em duas partes. Em tão pouco, ele mistura memória, mistério, ensaio e crítica cultural e artística. Tudo no ritmo ideal, sem alongamentos nem correrias. Final abrupto, mas é isso que surpreende, pois não deixa nada sem resposta - talvez a verdade do caso seja ambígua, mas esse era o objetivo, vocês entenderam o que eu quis dizer com "sem resposta", aquela sensação de "e..." que às vezes um livro deixa no leitor.

"Não houve gritos ou gestos para repelir-me, é importantíssimo frisar isso diante de ocorrências ulteriores. E se Inês, até então numa passividade quase desmaiada mas que eu podia tomar como receptiva por certos sinais em seu corpo, murmurou repetidamente nos últimos momentos: 'Oh, não; oh, não', não deveria isso ser interpretado como o seu contrário? Como um 'sim' de entrega dentro de um código amoroso?..." (p. 104)

A história tem uma carga erótica forte (o que é meio redundante de se anunciar em se tratando de um livro do Sérgio Sant'anna), eruditismo não tanto no linguajar (só em alguns momentos que podem soar mais pomposos) mas nas inúmeras referências artísticas, e consegue manter seu mistério até o fim. O título, Um crime delicado, não poderia ser mais exato. Tão delicado que quase passa despercebido e, mesmo depois do fim, não se sabe se foi crime ou não. Fica a cargo do leitor saber decidir se Antônio é vítima ou um criminoso carismático e verborrágico à Humbert Humbert (sem a pedofilia, só pra que fique claro). Um crime delicado realiza perfeitamente aquilo a que se propõe.

Nota: 5/5

sábado, 10 de janeiro de 2015

Inside Llewyn Davis: balada de um homem comum (Inside Llewyn Davis) - Ethan e Joel Coen [2013]


Preparados para mais um momento "vamos ver o quanto eu me lembro daquele filme que eu vi tanto tempo atrás e me esqueci de resenhar"? Pois será isso a postagem de hoje. Antes de qualquer coisa, uma nota. Viram só como eu tô organizado nesse começo de ano? 10 dias, 4 postagens - mais ou menos o total de postagens em um mês do ano passado. Vamos ver se assim essa porra vai pra frente. Antes de eu começar, peço também que não confundam Inside Llewyn Davis com a paródia pornô desse filme, lançada alguns meses depois, chamada Inside Llewyn Davis. É fácil confundir.


Já o filme é baseado naquela época que eu tanto gosto, a década de sessenta. Não o fim, mas o começo, 1961 pra ser exato. Mais ou menos quando o cenário folk em Greenwich Village, Nova Iorque, se desenvolveu. Llewyn Davis (Oscar Isaac) é um músico tentando ganhar espaço nesse meio, mas sem muito sucesso. Não é exatamente um iniciante, o disco que ele gravou quando ainda fazia parte de uma dupla fez sucesso, é sua carreira solo  - iniciada depois que seu parceiro, Mike, se suicidou - que não deslancha. Enquanto isso, seu amigo, também músico, Jim (Justin Timberlake) parece estar se dando bem. Jim é casado com Jean (Carey Mulligan), que também faz música em parceria com o marido.

Cansado de Village, Llewyn tenta a sorte em Chicago, pegando carona com um músico de jazz interpretado por John Goodman e um poeta beat. E o filme, então, é sobre essa jornada de ida e volta. Busca infrutífera, não por sucesso, mas por uma chance de ser - ter um disco gravado e distribuído.


A história de Llweyn é levemente baseada na vida de Dave van Ronk. Digo levemente porque as coisas que se passam no filme provavelmente não foram reais, apenas detalhes como o amor por Greenwhich Village, a insistência em fazer a música que ele quer ao invés da que vende, sem falar que as atitudes dos outros músicos, pessoal de gravadora e donos dos bares deve ser, pelo menos em parte, base em relatos da época, mais especificamente o livro de memórias que Dave van Ronk escreveu em parceria com o jornalista e pesquisador musical, Elijah Wald, chamado The Mayor of MacDougal Street (ainda não traduzida para o português e que eu tenho aqui, na minha estante. Ele às vezes me sussurra pedindo pra ser lido, mas os seus vizinhos falam mais alto). Também é uma semelhança o fato de Bob Dylan, antes da fama, ter usado Dave van Ronk como mentor - o que é só insinuado no filme, por meio de uma quase aparição de alguém vestido no estilo Dylan, tocando uma música dele.
 
 
O mais interessante no filme é a forma que eles tratam o conceito de "gênio". O mais comum no cinema é que o "gênio" seja mostrado como um incompreendido, alguém que merece muito mais reconhecimento do que de fato recebe, alguém que se recusa a atender as exigências do mercado em troca de uma arte pessoal, original e sincera. Histórias assim existem, mas são uma minoria. O cinema faz que elas pareçam banais de tanto que são contadas. Meu medo era que Inside Llewyn Davis fosse um filme desses, e é com grande alegria que eu digo que não é.
 
 
Sim, toda essa história do gênio é insinuada, salvo pela parte da genialidade em si. Muitas vezes Llewyn parece mais um cara teimoso, que quer ser visto como o maior nome da música folk, mas cujo temperamento o impede de chegar lá. O filme trata desse outro lado como eu nunca tinha visto antes.  O gênio que se vê como tal, quer ser visto como tal, mas não faz por onde. Acha que deve ser reconhecido somente pelas suas intenções, pela sua integridade moral visível quando ele, mesmo tendo talento e sendo procurado, se recusa a entregar às gravadoras o que elas querem. É muito nobre, no entanto, um gênio sem obra é só um cara comum deitado no sofá, pensando. Uma visão bastante melancólica, pode ser, e isso é porque o filme como um todo é bastante melancólico. Até o uso das cores, sempre entre o azul e o cinza, num clima eternamente nublado, escorre melancolia.




 
Por outro lado, a estrutura mostra um pouco de otimismo. No começo do filme o gato dos Gorfein (casal de idosos que admiram o trabalho do Llewyn) foge. Ao longo do filme, Llewyn tenta encontrar o gato, chamado o Ulysses, e, eventualmente, encontra um gato, mas que ele descobre mais tarde não ser o mesmo, já que Ulysses é macho e o que ele encontrou é uma fêmea. Ulysses desaparece, sem que se saiba para onde, mas volta pra casa um dia antes de Llweyn voltar de Chicago.

Ulysses, claro, uma referência à Odisseia - que eu não li, não podendo então dar um parecer mais exato dessa referência -, visto que o gato sai em uma jornada e volta para casa, mas também pode ser interpretado como uma representação do próprio Llewyn, que vai para Chicago e volta para casa (essa é a jornada do enredo. Ambos, quando voltam, voltam com marcas. Em Llewyn as marcas são internas, pelas experiências vividas. Ulysses, com uma listra a mais no pelo, ao menos é o que parece.


Essa é uma das minhas cenas preferidas. Vou apontar agora que a trilha sonora é tão boa quanto o filme, tendo sido, creio que ou toda ou a maior parte, interpretada pelos atores e atrizes. Essa música especificamente foi composta em referência a uma canção homônima gravada mais ou menos no mesmo período pela dupla The Goldcoast Singers. A única diferença é que a original fala da guerra do Vietnã e a do filme fala sobre a corrida espacial. Nada disso importa, o que eu quero apontar é a tensão, tão sutil, presente na cena. Parece que um deles ou vai se ofender ou vai estourar de frustração, mas, no fim, acabam esquecendo tudo em nome da música - que apesar da incredulidade de Llewyn, dá certo.


Eu indico muito esse filme. Por tudo. Pela atuação, pelo clima, pela época, pela música. Achei perfeito, um dos melhores de 2013. Indico também o disco Inside Dave van Ronk (viram a referência, pois é, quando Llewyn mostra seu disco para o produtor em Chicago, a capa é uma versão do disco real, com Oscar Isaac no lugar do Dave), que é o disco que resume o que foi a música folk.

Nota: 5/5

E se vocês acharam que eu não ia colocar umas músicas do Dave van Ronk aqui, vocês ainda não me conhecem.




quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Pintura Para Principiantes #3 - Edgar Degas


Como eu disse no PPP número dois, nessa edição vou falar de um impressionista, mas um impressionista que rejeitava esse termo, embora tenha trabalhado durante o pico do impressionismo e tenha sido amigo de gente como Monet, Manet, Renoir, Cézanne, artistas que se tornaram ícones desse movimento artístico. Edgar Degas (1834 - 1917) preferia o termo realista, para definir o estilo de sua arte. Foi mais conhecido por suas pinturas e desenhos de bailarinas e por focar seu estilo na captura do movimento da dança. Quanto a Degas, o ser humano, há controvérsias sobre o tipo de pessoa que ele era. De início ele parecia se esforçar para dar auxílio aos seus colegas de trabalho, mas com o passar dos anos ele foi se tornando cada vez mais recluso, ser cruel com suas modelos, perfeccionista etc. etc. Era também um conhecido antissemita, eis a importância de separar o artista de sua obra.


Sendo um perfeccionista, era comum ele criar várias versões de uma mesma pintura até que o momento que ele desejava capturar fosse retratado da melhor maneira possível. Por isso também ele tinha fama de grande desenhista, sempre fazendo rascunhos das suas pinturas antes de passá-las para as telas, hábito que estava se perdendo devido ao estilo impressionista de pintar o momento enquanto ele acontece, muitas vezes no local em que ele acontece. Pelo contrário, Degas era favorável, não a pintar a realidade, mas a usar meios falsos para simular a realidade. É visível a forma como as pinceladas tentando imitar o movimento da dança, do flutuar das saias, aos graciosos passos e gestos.


Essa pintura em particular demonstra ainda mais as intenções de Degas em retratar movimento. A imagem que ele forma não é muito diferente da que uma câmera antiga capturaria, caso a pessoa fotografada se mexesse.


Não só dançarinas, ele também pintava retratos da época. Na pintura acima, chamada L'Absinthe, dois boêmios, o homem é o poeta do romantismo, Paul Verlaine (aquele que comia e era comido pelo Rimbaud), tomando absinto em um café de Paris. Apesar da criatividade atribuída ao absinto, é visível no quadro a depressão e a solidão.


Degas pintava também nus incomuns para a época. Diferentemente do foco estético normalmente buscado em uma pintura desse estilo, Degas tinha por objetivo invadir a intimidade. Suas modelos eram retratadas durante o banho, após o banho, se secando, se vestindo, se penteando. Novamente, focando na movimentação, mas ao mesmo tempo na fragilidade. Ele não pintava poses, cenários aparentemente controlados. O que ele queria era expor aquilo que a sociedade de sua época preferiria manter escondido, a nudez por si só tendo se tornado lugar comum.



A impressão que fica é a de alguém buscando a perfeição em seu próprio estilo. E eu queria saber mais de pintura para poder fazer análises mais profundas, mas é só isso que eu sei. Como eu disse, isso aqui é tanto uma apresentação para vocês quanto para mim. Vamos aprendendo aos poucos. Se tem alguém por aí que entenda mais de pintura que eu, por favor contribua comentando sobre o assunto.


A ideia agora é manter uma espécie de cronograma no blog. Não vou especificar aqui para que não haja cobranças, já que a primeira coisa que eu vou fazer vai ser quebrar esse cronograma, mas o que eu quero é espalhar os temas. Não passar um mês inteiro sem falar de pintura, depois fazer 3 postagens seguidas sobre o mesmo tema. Quero botar ordem nesse barraco. Tentarei fazer, por semana, um post de literatura, um de música, um de cinema e um de pintura. Textos próprios sobre temas variados podem ou não surgir, mas as postagens sobre arte são "fixas", pelo menos até que eu mude de ideia.

sábado, 3 de janeiro de 2015

Momento Musical #6 - Funkadelic, Sly & The Family Stone, Black Merda, Mulatu Astatke

Mais um feito inédito no blog, estou seguindo uma sugestão de um comentário. Quem fez foi a Carol, do Uma Cadeira, Por Favor (e se você gosta de cinema, clique no link porque ela sabe das coisas), que sugeriu Funkadelic pro Momento Musical. Bem lembrado, então não só inclui Funkadelic na lista, como decidi seguir o tema Funk/Soul/Jazz pro Momento Musical número seis, até porque já é um estilo que eu estava querendo cobrir faz tempo. Isso é pra vocês saberem que eu presto atenção nos comentários de vocês e sugestões são bem-vindas. Vamos aos discos selecionados.

Funkadelic - Funkadelic (1970)


Esse é o primeiro disco da banda e um dos meus favoritos. Não é tão experimental quanto "Free your mind...and your ass will follow", que veio depois. Eles tem esse lado atmosférico na música deles, que deixam as letras parecidas com instruções de hipnose, que eu acho muito bacana, diferente do funk puro. A banda é impecável. A música em geral é tão hipnótica que fica difícil ouvi-la e fazer outras coisas ao mesmo tempo, como por exemplo escrever um post sobre música...Bom, eles se chamam Funkadelic por um motivo e, nas palavras de George Clinton, na primeira faixa, it will blow your funky mind.

Sly & The Family Stone - Stand! (1969)


Hoje em dia é difícil dizer que existe alguma igualdade na sociedade, mas na década de 60 os conflitos raciais estavam a beira de estourar uma guerra, as coisas estavam ficando violentas mesmo, com o assassinato de Malcolm X ('65) e Martin Luther King ('68), pra citar os mais conhecidos historicamente. Em meio a esse ambiente conturbado, havia aquele grupo feliz, que queria apenas igualdade, paz e boa música. Surge Sly & The Family Stone, uma das primeiras bandas, se não a primeira, a unir negros, brancos, homens e mulheres. Um marketeiro idiota usaria o termo "diversificada" pra definir a banda, mas a verdade é que se trata apenas de uma banda de humanos (sem querer discriminar os animais, acontece que cães são péssimos com instrumentos de corda e sopro, além do problema do déficit de atenção, e gatos seguem apenas carreira solo etc.). Ah!, já ia esquecendo, o disco é muito foda.

Black Merda - Black Merda (1970)


Uma banda, infelizmente, esquecida pelo tempo. Black Merda pode parecer um nome engraçado no Brasil, mas o que eles quiseram fazer foi imitar a grafia "falada" da palavra Murder, ao mesmo tempo descrevendo a situação racial da época, 1970, quando negros eram assassinados sem que houvesse consequência. Em estilo, eles eram mais para o rock que para o funk, lembrando uma versão menos frenética de Jimi Hendrix Experience. Vale conhecer, eu juro que não sei porque eles não foram maiores naquele tempo.

Mulatu Astatke - New York–Addis–London: The Story of Ethio Jazz 1965–1975


Mudando um pouco de estilo, esse está mais para jazz que qualquer outra coisa, mas não chega a se separar tanto do funk, do soul, incluindo na receita um pouco de afro-beat e música latina, Mulatu Astatke é um ícone do chamado ethio-jazz (jazz originado na Etiópia). O disco não é um álbum, mas uma compilação de músicas que ele gravou entre 65 e 75. A idade do Momento Musical é fugir de compilações e focar em álbuns, porque desde o surgimento do mp3 o álbum tem perdido sua importância e os ouvintes têm focado nos "hits", o que me incomoda um pouco. O problema é que nem sempre o Youtube vai ter um álbum ali disponível. Aí eu vou ter que me decidir se eu mesmo faço o upload e me arrisco a entrar nessa putaria dos direitos autorais, deixo de falar do músico cujo álbum não está no Youtube, ou me contento em disponibilizar uma ou duas faixas. Nesse caso específico, Mulatu Astatke tem uma carreira tão extensa e rica (e ainda ativa), que focar em um álbum negligenciaria muito do estilo dele. Além do mais, essa compilação é perfeita, tem um pouco de tudo e é o que eu sugeriria a um curioso que não conhecesse nada do jazz etíope.

Por hoje é só, minhas crianças. Escutem a música, isso é o mais importante.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

A poesia de Paulo Scott

Tem jeito melhor de começar um ano de postagens, após ter feito a promessa de que resenharia coisas que nunca me considerei digno de resenhar, com um texto sobre poesia - que nunca tive coragem de falar sobre, se não por um ponto de vista impessoal e teórico, embora academicamente inapto? Pois assim começarei, falando de um dos poucos poetas contemporâneos que acompanho, o Paulo Scott. Não irei tão longe a ponto de resenhar uma coleção específica, e dar nota a ela, seguindo meu formato usual, não. Vou falar dos dois livros que li dele, tentar descrever algumas das sensações que eles me causaram, e isso pode ser considerado uma indicação automática para vocês, parcela dos meus leitores, que gostam de poesia.


Fui surpreendido pelo lançamento de Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo (Companhia das Letras), em 2014 - já falando como se fosse algo distante, mas a verdade é que quase publiquei o texto tendo escrito "esse ano" -, coleção mais recente do Paulo Scott. Demorei um pouco para comprar, porque, talvez por ser poesia, nem todas as livrarias o tinham disponível. Mesmo assim consegui comprar e ler o livro antes do fim do ano passado e, devo dizer, foi uma das minhas leituras favoritas no ano (mesmo que eu tenha terminado a dita leitura ontem, por volta das sete da noite).

Não foi a primeira coleção do Paulo Scott que eu li. Já havia lido também a primeira, creio eu que em 2014 também, mas logo no começo, chamada A timidez do monstro (Objetiva). Por isso, a primeira coisa que me ocorreu durante a leitura de Mesmo sem dinheiro foi a diferença no estilo. Antes que eu me estenda, vou avisar que o livro foi dividido em duas partes. A primeira, chamada Livro Um, é onde a diferença mais notável está. O Livro Dois, embora carregue alguns dos aspectos do Livro Um que diferenciam essa coleção da primeira, tem uma linguagem muito mais aproximada.


 Diferentemente de A timidez do monstro, o Livro Um de Mesmo sem dinheiro tem em cada poema uma narrativa, levemente abstrata, mas não muito. Paulo Scott desenvolve personagens em seus poemas, cenários que podem ser reais ou fictícios, sempre breves e precisos que, por trás da linguagem poética, contam uma história muito maior. E eis o motivo de eu sempre ter evitado resenhar livros de poesia. Os parágrafos a seguir desse texto estarão cheios de suposições sobre as intenções do autor que eu, nunca tendo falado com ele, não teria como saber. A questão é que, e isso é uma opinião pessoal minha, um poema, como qualquer outra obra de arte, quando tornado público deixa de ser do autor. Na prática, lógico que o texto segue pertencendo ao autor, estou falando do significado dele. Um leitor nunca lê a poesia do poeta, ele lê sua própria poesia nas palavras do poeta. Ele vai entrar no texto e investir no texto os seus próprios sentimentos, mesmo que isso não faça tanto sentido. Por isso, tudo que virá a seguir não pode de forma alguma ser considerado correto, objetivo ou imutável. O leitor pode, deve, ter impressões diferentes, tão diferentes quanto as reais intenções, se existentes, do poeta.

Enquanto em A timidez do monstro a linguagem parece ser propositalmente hermética, formada de associações líricas entre as palavras, mais focadas em som que em sentido, o Livro Um de Mesmo sem dinheiro segue um caminho direto, quase doméstico.

Fidelidade

ficava clareando os olhos gaúchos no espelho
tentando aprender o modo certo de falar na tevê

ficava irritada, meio cega e míope, seu nome paraíso
e não sabia se o próprio choro era choro de verdade

fizeram-lhe óculos para esse tipo de exame final
média seis e cuecas na altura de joelho na testa

lentes roxas em grau sumô natural luzes apagadas
lentes autolubrificantes espessura goles e goles de festa (p. 20, Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo)

Os personagens são esposas, maridos, filhos, gente encarando a idade adulta com insegurança, as crises do não estar sendo tão produtivo quanto se cria que seria quando jovem. A ansiedade está presente em ambas as coleções, mas em Mesmo sem dinheiro ela parece ter mais foco, ou pelo menos um foco diferente. Digamos que a mente por trás da poesia seja a mesma, mas o filtro poético pelo qual as palavras passaram para se tornarem o que vieram a ser é outro.

de tarde na vila madalena

vago sol
que cai
e feta
sobre
o lombo
de livros (p. 31, A timidez do monstro)

Um detalhe que ajuda a definir o clima de A timidez do monstro, não presente na nova coleção, é as ilustrações. Feitas por Guilherme Pilla, elas representam essa violência abstrata e não direcionada do primeiro livro muito bem, ajudam a complementá-lo, como as ilustrações devem ajudar. Mesmo sem esqueite, no quesito violência, assume um tom mais passivo, talvez por isso mais adulto.

Primeira temporada completa

1.
descer de petrópolis com os olhos fechados
contando até dezoito antes de abri-los de novo
enquanto a companheira dorme na garupa
da vespa, achando que são frequência, papel

2.
então me liga quando chegar na beira da praia
e me conta como é voar com a infelicidade
enfiada no rabo - curso do seja homem
e repita que nunca mais torceu pelo touro

3.
chuva de pólen sobre cativeiros de peixes
assim ficaram teus olhos depois que abri os meus
casca de sexta-feira, carpas nadando em antibiótico
(show de exorcismo e) pudim de resfenol

4.
pedindo desesperada para eu frear - m. brando
em sessão da tarde - você me encara, determinada,
pergunta se o sol nasce ali mesmo
se a gente tipo é casado ou tipo vai só namorar (p. 42 - Mesmo sem esqueite...)

O Livro Dois já relembra o estilo de A timidez do monstro, não sei se há algo de proposital nisso (não sei se qualquer coisa que disse até agora fez muito sentido). As rimas e aliterações, embora ainda livres, estão mais presentes, e as palavras voltam a favorecer o som que o sentido.

olho que é grade que ouve
ovo que é linha no poema

sem atritar a surdez do ovo
e de novo que é filme de foto

o couro mais forte do corpo
pele global nata lacrada ovo

o olho é um ovo que engole
um ovo que nasce geminado

portanto o olhar não é só (p. 68 - Mesmo sem esqueite...)

Não é só poesia que o Paulo Scott publicou, mas foram só as poesias que eu li - não por algum motivo específico,  na verdade agora quero partir para a prosa. Além desses dois livros dos quais falo, ele publicou Voláteis (romance, pela Objetiva/Alfaguara), Habitante Irreal (seu romance mais conhecido, pela Objetiva/Alfaguara), Ithaca Road (romance da coleção Amores Expressos, pela Companhia das Letras) e Ainda Orangutangos (contos, pela Record). Houve ainda mais uma coleção de poesias, Senhor Escuridão, pela Record, que ainda não li. Por ter lido apenas o primeiro e o último livro dele, a impressão maior que tive é que, entre eles, houve uma grande mudança no estilo, e eu não acompanhei a transformação (se essa de fato aconteceu) por não ter lido os outros livros. Pretendo lê-los o quanto antes.

cavocando o cano da vocação

as formigas estão felizes
capinam as gotas açucaradas
sobre a pia de granito verde
envolvo-as num círculo de sabão
(é forte odor de maçã)
Avelina abre a porta e me surpreende
meu dorso de maracanã eriça
e perpassa em correntes
uma brisa esquecida
uma solidão de paraíso (p. 78 - A timidez do monstro)

No começo da resenha disse que ele é um dos poucos poetas contemporâneos que acompanho, mas já recolhi alguns nomes e pretendo mudar isso esse ano. Tem coisas interessantes acontecendo por aí hoje em dia e eu quero saber o que são.

Hoje sem nota. O livro está aí, indicado para quem queira ler. E abaixo tem um link para o primeiro poema de Mesmo sem dinheiro, disponibilizado pela Companhia das Letras. Divirtam-se crianças.
 
http://www.companhiadasletras.com.br/trechos/13760.pdf