Vejam só, consegui cumprir minha promessa de resenhar os filmes do Oscar antes da premiação pelo menos com um dos filmes, agora faltam todos os outros. Esse, pra falar a verdade, tem sido meu favorito pra ganhar a maior parte dos prêmios desde o início (lembrando a vocês que haverá previsão esse ano também). Nas categorias principais, imagino que não haverá muita surpresa, a não ser que os outros concorrentes sejam muito surpreendentes (e devo dizer, com o risco de parecer um babaca após a premiação, que não parece ser esse o caso). Mas não estou aqui só pra elogiar, estou aqui pra explicar.
Decadente, definido por uma carreira cinematográfica medíocre e preso a um personagem esquecido, Riggan (Michael Keaton) quer ser levado a sério e, para tanto, decide produzir uma montagem teatral de "Do que falamos quando falamos de amor", um conto aclamado do Raymond Carver. Essa montagem envolve a relação de Riggan com os outros atores, incluindo um porra-louca nos palcos mas brocha na vida ator pretensioso que quer roubar o holofote e pode muito bem ter o talento para tal Mike (Edward Norton), e a atriz fazendo sua estreia na Broadway e realizando um sonho Lesley (Naomi Watts), seu co-produtor e amigo Jake (Zach Galifianakis), sua filha drogada (Emma Stone), sua ex-esposa, sua atual namorada (que também é atriz na peça), os críticos, os jornalistas, o público e o seu próprio passado. Birdman, então, é esse momento da vida de todas essas pessoas.
Vai ser muito fácil eu me perder nos elogios, então deixa eu tomar cuidado aqui e decidir por onde eu quero começar. Vamos ao elenco, que é o mais óbvio. Cheguei a me preocupar quando vi a quantidade de nomes, grandes, iniciantes e esquecidos nesse filme. Por um lado foi bom, me ajudou a refrear minhas expectativas. Cada um dos personagens, principais e secundários, executam seus papéis com perfeição. Claro, uns chamam mais atenção que outros, mas ainda assim, não tem nada fora do lugar. Michael Keaton principalmente. Não acho que alguém no mundo se lembrava do que ele era capaz de fazer como ator, mesmo esse papel sendo mais ou menos como a vida dele (ele foi, afinal, o Batman, lembram?, muito antes do Christian Bale. E nem foi ruim aquele primeiro filme, melhor que Dark Knight Rises, mas isso é outra história). Ele foi o Batman, fez uma série de decisões ruins na vida e ninguém mais o levava a sério, até que ele fez Birdman e agora é favorito ao Oscar, quem diria?
Tecnicamente falando, é impossível ignorar o artifício da edição, que fez o filme todo parecer um take só. Mesmo não sendo - e sendo possível fazer filmes em um take só, vide Arca Russa (Sokurov) -, ainda é muito impressionante. Não é só um jogo vazio, no entanto. A ideia é trazer ao espectador o mesmo senso de imediatismo de uma peça de teatro, essa que nunca tem cortes depois que começa, além de aumentar e muito o grau de imersão - o que é importante em um filme que se passa, em parte, na cabeça doente de seus personagens, principalmente na de Riggan.
Falando em cabeça doente, eis outra brincadeira do filme. O que é realidade e o que não é? No começo, a resposta parece bem clara, mas, conforme o tempo passa e a situação de Riggan se agrava, mas tênue é a linha que separa a alucinação do real. Isso também é usado para criticar a cultura de massa de forma nada sutil, vide a cena em que Birdman aparece e pede ao Riggan para dar ao público aquilo que eles querem (ação, explosões, CG, super-heróis etc.). Fiquei na dúvida por um tempo se eu achava que a falta de sutileza nisso era um defeito ou não, afinal de contas o discurso contra o "mainstream" já tá mais do que batido e deu o que tinha que dar. Por outro lado, tem algo de fresco na forma que esse discurso se dá em Birdman. É pelo ponto de vista de um ator que foi o mainstream (no filme e na vida real) e está tentando fazer a transição para a chamada "alta cultura" e não sendo bem visto por isso, mostrando que não adianta, ninguém nunca está satisfeito. Isso fica mais óbvio quando Riggan se vê entre o público e conhece a cultura da internet. Pode parecer muita informação que eu estou dando aqui, mas acho que estou sendo vago o bastante. Vou parar por aqui, de qualquer forma, só para garantir que não vá ter choradeira mais tarde por spoilers (como se isso acontecesse por aqui...as pessoas não vêm no meu blog nem pra falar mal).
É tudo tão perfeito, medido e exato em Birdman, pra que o truque da edição funcione, que até a trilha sonora - nada além de um solo de bateria de jazz - é sincronizado com a história. Seja quando um baterista aparece mesmo na rua, aparentemente tocando o mesmo solo do filme, seja quando o Riggan dá um tapa na porta ao mesmo tempo que o músico bate no prato da bateria (se isso não render um Oscar de edição de som, não sei o que renderá). O filme é um relógio pontualíssimo, que mesmo assim não perde a naturalidade. E por isso se tornou meu favorito esse ano para as premiações. Se eu estarei certo ou não, se eu vou mudar de ideia amanhã ou não, não me importa. Não sou muito de me responsabilizar pelas minhas afirmações. Uma coisa eu tenho certeza, indico o filme.
Nota: 5/5
Ainda não assisti, mas pretendo assistir todos os indicados a Melhor Filme antes da premiação, então essa semana vou dar um pulo no cinema para conferir "Birdman". Muito bom saber que você gostou, já estou com as expectativas altíssimas para esse filme, pois entre todas as minhas amigas cinéfilas, ele é o preferido.
ResponderExcluirwww.bibliophiliarium.com
Assista e depois me diga o que achou. Expectativas podem ser prejudiciais, é bom avisar.
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