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sábado, 10 de outubro de 2015

Eu não nasci poeta



Eu não sei fazer verso. Minha rima é literalmente morta. O meu texto parece que vive de ferrugens. Eu não nasci poeta. Minha mãe já bem dizia — poesia só enche barriga de lagartixa. Quando descobri foi um choque. Eu não sou poeta. Eu não sou poeta. Dias e dias batendo a cabeça na parede desesperado. Mas, porque não sou poeta? O que me falta? Um caderno, um dicionário, uma bagagem de livros antigos? Camões com dor de barriga escrevia poesia? Penso logo, desisto: e se existir a tal da reencarnação? Quem sabe, eu nasça um Gullar meio discreto em outra vida, e deixe de ser mãos tortas. Esse meu corpo agora sabe até jogar bola, mas poesia nem sentado de frente da materialização da beleza sublime. Poeta: “ou é, ou não é” já disse o Leminski. Fazer o quê né? Se quando vejo um pôr do sol agarrando os ombros de uma montanha fico todo assustado com o castro poético. Castração poética. Escreva um glossário sobre... esqueça o glossário volte e não aprenda. Não entende? Então, você não é poeta. Poeta gente, é quem quiser. Não vai ser um laureado que vai me tirar o verso da boca. Seja verso ruim ou não; ninguém é gênio toda hora. Qualquer um no mundo pode ser poeta, basta ter coragem. Parábola daquele filme que o rato cozinha. O rato poeta ensina ao crítico casmurro: qualquer um pode escrever poesia. Repitam. Repitam. O que ninguém sabe é como escrever, como cozinhar, jogar bola, fazer cálculos matemáticos. Você aprende na prática, mas tem sempre uns e outros, que já nascem com o tal do “dom”. Não acredito, ou deixo de acreditar. Para mim é que nem Deus, só existe quando sinto medo. Poesia é preciso ter técnica. Como um jogador de futebol recebendo uma bola difícil de dominar; se ele conseguir dominar a bola ele consegue dominar o poema de primeira, acerta-lhe uma bela trivela.

Todo ser vivo e não vivo é poeta? Sim. Até um computador já fez um livro de poemas. Sabiam (busquem no Google seus preguiçosos)? A poesia é fútil, mas fútil que a própria arte. A arte ainda é intrínseca, relativista quando o assunto é defini-la, mas poesia, todos já sabem, que não vale de porra alguma. Honestamente, essa coisa de nascer poeta é definir, e definir é limitar. Poetas gabaritados que carimbaram essa lei são os mesmo que dizem que a poesia não tem limite é infinita. Espera. Então quer dizer que nasce poeta, mas a poesia não tem limite, então... tirem suas conclusões ou joguem no Google. O homem-cavalo que galopava todas as noites em busca da licença poética, hoje galopa  na sombra de um jóquei gorducho, mal sabendo o pobre homem-cavalo que, havia perdido o hífen poético num trote casual. No mais, eu fico desesperado. Dentro do ônibus olhando pela janela ao voltar do trabalho, vejo o homem-cavalo com os cascos feridos de trotar na poesia polida. Que viagem minha, mas o homem-cavalo agora só é vertigem. O motorista do ônibus já tá mais de hora atrasado, e agora acelera três marchas num só trote.

"Xerox, cheiro de lótus
no papel preto e branco
carbono

O poeta a beira-mar. Fortaleza já teve um cenário todo poesia. Hoje é só perdição, assaltos, furtos, furos e tráfico. O sol vêm derretendo os poetas cearenses, nem mais consigo avistar longe o sol obtuso que antes era de José Alcides Pinto. O maldito que cantava odes pornográficas. Os poetas vêm morrendo por que tem medo de escrever poesia. Culpa desse sinal de nascença. Poetas já morrem antes do parto, quando descobrem que seu expoente nasceu poeta. Desistem os pobres meninos que fazem versos de amor para a menina da primeira fileira da escola. A moça, a menininha, lendo Florbela Espanca aos doze, se espanta com a obra da portuguesa. As poetizas que me perdoem, mas poesia é como mulher: doce, misteriosa, sensível, forte como um obelisco. O menino que começa com o soneto sobre a fita azul no cabelo da enamorada, logo, vai explodir todo o seu sangue no papel amarelado. A busca pela técnica perfeita não existe. Sempre um verso simples verdadeiro vai ser melhor que um verso complexo e forçado. O que faz poesia é a rotina. Até caros amigos, um funcionário de gráfica rápida tira bons momentos, haicais da sua labuta: xerox, cheiro de lótus/impressa no preto e branco/carbono. Só cuidado com a poesia, ela exige muitas saídas, muitos porres, muitas quedas e risos, Bons poemas é preciso muitas marcas, os gatos já sabem que existem poemas que custam bem mais que sete vidas. Escreva, reescreva, organize. Poeta, por favor, ande sempre com um papel e lápis no bolso, quem sabe a poesia esteja atravessando a rua, ou sendo esfaqueada. Não perca, tente ajudá-la a sair desse paraíso fictício que você a colocou. Leve a poesia para tomar uma cerveja, um café. “Se você quer que as palavras transem, não as masturbe”. Poeta. Não caia na discórdia de parar de escrever poesia, todos somos poetas; só não sabemos. É que nem apendicite, dente siso. Aprenda só que para ser poeta é preciso não exigir nada de nada, mas para fechar eu exijo (olha que eu não sou de impor, mas...) que vocês compareçam mais nos comentários, porra galera! Não temos lá essas coisas de leitores, e os que temos não comentam. Aí eu vou chorar igual quando assisto a qualquer filme em que o cachorro morra no fim. Por favor, comentem mais ou eu vou partir para uma maratona de filmes que me deixam com os olhos suados. Isso é sério!

Um comentário:

caixa do afeto e da hostilidade