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quarta-feira, 29 de abril de 2015

Raymond Carver

Por Maria Ferreira

Antes de começar, quero dizer que há tempos Carver é um escritor muito prezado por essas bandas. Em outubro de 2013, o Rafa traduziu alguns de seus poemas, em dezembro do mesmo ano resenhou o conto Por que não dançam? e em janeiro do ano seguinte resenhou o livro Iniciantes, além disso,  o autor já foi citado inúmeras vezes em outras postagens. Quando eu percebi isso, quase desanimei de escrever sobre ele por aqui, mas resolvi seguir com a ideia porque este ano eu tive o meu primeiro contato com o autor e porque cada pessoa tem sua interpretação individual (apesar da minha não diferenciar muito da do Rafa).



Raymond Carver foi um escrito norte-americano, que se aventurou como poeta, ensaísta e contista e encontrou seu ápice na narrativa curta. Nasceu em 1938, no estado de Oregon. Casou-se aos dezenove anos ao engravidar  uma jovem três anos mais nova, com quem teve dois filhos.
Viveu uma vida turbulenta, marcada pela pobreza e pelo vício no álcool. Precisou trabalhar em diversos subempregos para sustentar a família.

Em 1974 publicou Will You Please Be Quiet, Please? e em 1981, publicou seu livro What We Talk About When Talk Love (Do que estamos falando quando falamos de amor), um de seus livros mais conhecidos e que foi responsável pelo título de minimalista que o autor recebeu. Hoje é sabido que este livro foi completamente alterado por seu editor Gordon Lish. Um caso que provoca certa polêmica, porque há pessoas que dizem que se não fosse por ele, o autor talvez não tivesse obtido tanto reconhecimento e há pessoas que são favoráveis ao autor.

Raymond Carver e Tess Gallagher


Divorciou-se da esposa em 1977. Ano que, com a ajuda dos Alcoólicos Anônimos, conseguiu se livrar do vício e ano que conheceu a poetisa Tess Gallagher, com quem morou nos dez anos seguintes e casaram-se em 1988, pouco antes de Carver falecer devido a um câncer de pulmão.

Atualmente, Carver é considerado um dos grandes contistas do século vinte. Seus contos se inserem no chamado "realismo sujo" pela constante presença do cotidiano, a representação da vida de pessoas simples, numa escrita seca e sem metáforas.

Os contos do autor podem ser encontrados no Brasil pelos livros "Iniciantes", de 2009 e "68 Contos de Raymond Carver", de 2010; ambos publicados pela Companhia das Letras. É importante dizer que em "Iniciantes" temos a versão original dos contos alterados por Gordon Lish e em "68 Contos...", temos a versão alterada. A Rocco publicou o livro "Fique Quieta, por favor", mas atualmente a edição de encontra esgotada. Seus poemas ainda continuam inéditos por aqui, mas é possível encontramos algumas traduções pela internet.


domingo, 26 de abril de 2015

Momento Musical #9 - T. Rex, Nilsson, Syd Barrett





Nessa edição do Momento Musical eu decidi indicar álbuns com os quais eu ando obcecado. Discos para os quais, cedo ou tarde, quando bate aquela dúvida sobre o que ouvir, eu retorno. Ao mesmo tempo, eu procuro evitar aqueles artistas que todo mundo conhece ou que nunca foram esquecidos. Esses três, em particular, são clássicos, mas não mantiveram, por qualquer motivo, o mesmo reconhecimento que alguns de seus contemporâneos. Estou aqui pra espalhar a palavra desses caras.

T. Rex - Electric Warrior (1971)


T. Rex começou como uma banda que pendia mais pro folk - e nesse período eles iam pelo nome Tyrannossaurus Rex. Aí eles deixaram o som mais elétrico e, praticamente, criaram a estética do que viria a ser o rock. Pro bem ou pro mal, se não fosse pelo Marc Bolan (líder da T. Rex) e pelo David Bowie, bandas como Kiss, Whitesnake, Scorpions, não existiriam ou não seriam as mesmas. Muito do que surgiu no rock pós 73 deve pra essa banda - infelizmente, em se tratando de som, as bandas pós 73 não seguiram o mesmo padrão de qualidade. T. Rex, considerando o que existia no rock daquela época, é muito original, não soa como nenhum dos seus contemporâneos. Entre o fim da década de 60 e começo de 70, com o fim da popularidade da psicodelia, Led Zeppelin e Deep Purple se tornaram meio que um padrão do que devia ser o rock - exceto pelo pessoal do rock progressivo, que trilhava um caminho quase oposto -, T. Rex, no entanto, soa como T. Rex, o que é muito bom.

Nilsson - Nilsson Schmilsson (1971)




Falando de artistas que soam como eles próprios, não conheço nada na música pop que soe como Harry Nilsson. Muitas das músicas que ele interpreta são clássicos do jazz e do blues, outras são composições próprios, mas todas são muito particulares. Não existe, que eu sabia, nada assim rolando hoje em dia. Não consegui achar o disco todo, normalmente isso faria eu não falar sobre o artista, mas dessa vez eu fiz uma exceção, porque vale a pena. Coloquei aqui algumas das minhas músicas favoritas do disco e no fim do texto vai ter um link pra uma playlist que alguém fez reunindo todas as músicas. Não sei bem que fim levou o Harry Nilsson. Quero dizer, ele morreu em 1994, mas antes disso ele já tinha sumido. Ele era bem popular, mas por algum motivo parou de fazer música na década de 1980. Como eu queria que outros artistas (Yes, Genesis, Bob Dylan, Scorpions, Whitesnake, Santana etc. etc.) tivessem feito o mesmo. Alguns artistas retornam ao interesse do público depois de  um longo período de esquecimento, mas isso nunca aconteceu com o Nilsson...pena. Link da playlist: https://www.youtube.com/watch?v=4wgrzp1DCs4&list=PLdvAo5zrwY6iqn2DWdRobnbsW_FV9MMwp&index=1

Syd Barrett - The Madcap Laughs (1970)


E falando de gente que sumiu, Syd Barrett talvez seja o melhor exemplo disso. A mente genial e louca que começou o Pink Floyd, antes do Roger Waters. Pessoalmente, acho que as melhores músicas do Pink Floyd são as da era Barrett, no entanto ele exagerou nas doses de LSD, o que acontecia com frequência naquela época, e ele se tornou impossível de trabalhar com. Ele chegou a lançar uns discos solos, pra nossa sorte, e The Madcap Laughs é o mais conhecido deles. As músicas são de uma qualidade poética impressionante. São bem simples, mas as letras são ricas, cheias de jogos de palavras. Sugiro que vocês as procurem quando forem ouvir o disco, isso torna a experiência mais profunda. Ele morreu em 2006, mas desde 1972 ele não fazia muito porque, bom, ele era reconhecidamente instável, como os bons costumam ser.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Tristeza


Às vezes me sinto tão triste que parece que tudo fora de mim é mais vivo. Fico perdido, confuso... não sei? Não. Não vou ter nenhuma crise existencial: até por que consigo resolver meus problemas existencialistas com algumas doses de uísque (15 anos bem resolvidos). A tristeza que sinto é oca, sem sentido. Parece que alguma coisa fica mordendo meu trilho. A tristeza é humana e, na medida do possível tento escapar dessa fera lépida que me atormenta continuamente. Leio, releio nas entrelinhas da vida encontrando sempre respostas que já sei, busquei aos poucos soluções nos loucos, nos sem compromisso, mas eles já não tinham o que dizer sobre a tristeza. A verdade é que todos sabem que o mundo tem uma infinidade de problemas muito piores do que essa minha tristeza, mas tento justificar o injustificável. Existe no mundo uma tristeza das mães, dos filhos, dos animais, “objetos”, estrelas, mar, céu... Essa tristeza dói tanto que ela acaba se tornando uma tristeza coletiva. Tenho a impressão que essa tristeza chegue numa frequência menor em mim (microscópica), talvez, a tristeza foi aos poucos sendo metamorfoseada em meu corpo. A tristeza é como uma fúria no meu deserto. Minha tristeza, vossa tristeza, todas as tristezas que sentimos é algum estilhaço do mundo. A arte é na sua essência triste e simplória, assim como a vida. Essa tristeza que sinto é necessária para minha sobrevivência, mas bem que ela poderia vir menos mexer com a minha índole. No dicionário diz-se que tristeza é: falta de alegria, esmorecimento, desânimo, abatimento, melancolia. Não quero dizer que o seu Aurélio esteja errado, mas tristeza é o estado natural das coisas. O ser humano colocou tristeza na sua genealogia. A tristeza já existia muito antes do big bang, neologismo ignóbil de fazeres desconhecidos, parônima selvagem. Como se diz a palavra tristeza em alemão? Agora como se diz tristeza de forma universal? Ninguém quer responder. Acabo este texto no meio da rua enquanto vejo um homem cair do nada na calçada, meia dúzia corre para socorrê-lo. Chego devagar, e logo, reconheço que se tratava de um AVC. Ligo para ambulância dou todas as coordenadas.  Resolvido. Pego o ônibus.  Já em casa... Descubro que não, não existe tristeza mais triste que o fardo de viver. O cotidiano é quem nos deixa triste, repetitivamente tristes. Somos e seremos tristes algum dia e não ligaremos mais para isso. Quem sabe, se não estivesse tão triste teria ficado com o homem até a chegada de sua morte no leito do hospital, mas a tristeza certas vezes não perdoa ninguém que cruza seu caminho. As ruas silenciam. Vou dormir. 

“A arte existe porque a vida não basta.”

Ferreira Gullar acertou na artéria do corpo mundo com essa frase. A arte ela é onisciente quando o assunto necessita de ir além. Tenho que confessar: a arte foi uma maldição que jogaram em mim, mas dentro dessa loucura que chamam de vida, não sei o que seria de mim sem ela. Lembro o meu primeiro choque com Dickens, Godard, Kubrick, Hemingway, Truffaut, Victor Hugo, Greenaway, Dostoievski, José Alcides Pinto, Allan Poe, Moreira Campos, Fernando Sabino, Gorki, Faulkner, Kafka (até hoje sonho me transformando, saindo de uma casca). Depois veio a poesia e um interesse maior pela música. A arte serve para sairmos da casca de nós mesmos. Doutrina totalmente kafkiana. Na arte tudo se transforma ou se torna uma transformação. Foi necessário que escutasse muito Bob Dylan para entender as pedras que rolam. Bebido por muitas horas para lembrar os caminhos de Zaratustra. O poder que arte tem de criar uma nova perspectiva é simples: basta você ter uma mente aberta, ou então, tenha sempre um pé de cabra para abri-la. O artista no geral, ganha o interesse para produzir arte quando sente falta de repostas que ele daria. O universo das respostas é estreito. Sobre os dilemas que viciam o ser humano e o mundo temos essa pergunta primaria que a humanidade vai levando até seu perecer. Esse questionamento é quase mítico dentro de um pensamento não científico, mas esses círculos de pensamentos continuam e continuará sendo o gatilho para o livramento metafísico da vida.  Tento me imaginar com um livro escrito por mim resolvendo os problemas do meu eu de dezesseis anos. As minhas escolhas e minhas perguntas foram desfiguradas pelo tempo, porém, não tive muitas decepções amorosas para criar aquele ego ultra narcisista; havia nascido maduro, perdido o caminhar da minha juventude, abandonado o meu cordão umbilical lá no sertão (quem saiba daí aquela tristeza), enfim, mudei tanto o meu caminhar que no fim, a melhor reposta que daria para o meu eu de dezesseis anos seria para não escutar essa filha da puta do futuro. Com meus dezesseis anos pensava em ser Sartre fundido num trapalhão (Muçum), logo depois quando li Salinger queria fuder com o mundo com meus gritos misantrópicos, punks cheios da minha virtuose. Com o tempo entendi como a arte mexeu comigo. A arte me deixou meio ranzinza, pessimista, anárquico, me levou a lugares estranhamos e desconhecidos, mas deu total liberdade para discordar de suas intenções. Toda arte que já consumi me basta, dentro de um contexto: a falta do excesso é o que torna a perfeição absoluta e, como um artista medíocre que sou eu me autoavalio. Parem! Eu confesso: sou um sujeito sem jeito que tem lá seu valor quando consegue organizar seus erros. Parem! Confesso: toda noite que morre, a arte é quem me socorre. E se a vida imita a arte? Eu consumo a arte, mas a vida é quem me consome, então, a arte é a vida? O certo é que o fim é o principio “a arte existe porque a vida não basta.”

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Hard-Boiled Wonderland and the End of the World (Sekai no owari to Hādo-Boirudo Wandārando) - Haruki Murakami [1985]




Já fazia tanto tempo desde o último texto sobre Haruki Murakami aqui. Fazia tempo também que eu não lia nada dele. Depois que travei no terceiro livro de Wind-up Bird Chronicle, achei que tinha cansado dele, ultrapassado algum tipo de limite. Só precisava de umas férias, agora já está tudo bem e eu voltei a querer ler tudo que esse japonês maluco já escreveu. Não voltei a Wind-up Bird ainda, farei isso logo, antes de pegar 1Q84. Antes eu quis ler o livro que o próprio Murakami diz melhor representar seu estilo e ser o seu favorito dentre a sua obra (costumava ser, uns anos atrás, quando ele deu uma entrevista pra Paris Review, hoje eu não sei se ainda é). Se o meu problema com o Muraka era que ele estava começando a soar sempre como mais do mesmo, Hard-Boiled Wonderland and the End of the World (título bem longo e difícil de traduzir, eu sei. Seria algo como País das Maravilhas Cozido e o Fim do Mundo. Esse cozido sendo o termo culinário para Hard-Boiled, e não o literário, que era pra ser pra que o título faça sentido. Hard-Boiled é o gênero literário que Raymond Chandler e Dashiell Hammett ajudaram a definir, um tipo de história de detetive, violento e com personagens amorais etc. É um estilo bem popular no Japão e que influenciou bastante o estilo do Murakami.) serviu pra me mostrar todo um lado do autor que eu não conhecia e que pode ser o lado mais interessante dele.

Uma Tóquio que pode ser futurista (o texto não define nenhuma data) está dividida entre dois grupos em guerrilha, o Sistema, que é um grupo regulamentado quase governamental, e a Fábrica, grupo criminoso. O primeiro usa Calcutecs, processadores humanos de dados eletrônicos, para proteger informação. O outro faz uso de Calcutecs que se rebelaram pra roubar informação. Um Calcutec do Sistema, alienado de toda a briga, sem nome (como todos os outros personagens do livro), é contratado por um cientista recluso para  processar um monte de informação. Esse cientista pesquisa remoção e manipulação de som e  desenvolveu uma forma de ler o subconsciente das pessoas, tudo isso baseado no trabalho que ele realizava quando funcionário do Sistema. Trabalhando para o cientista, o Calcutec descobre que só tem mais 36 horas de vida.

No Fim do Mundo, cidade estranha e isolada (a edição americana vem com um mapa desenhado para melhor compreensão do leitor), chega um novo morador. Mas existe uma particularidade em Fim do Mundo, os moradores têm suas sombras removidas e largadas para morrem, fazendo que eles percam suas mentes. Cada morador tem uma função e é mencionado como tal pelo narrador (o Guardião do Portão, a Bibliotecária, o Coronel etc.). O lado de fora é cercado por bestas que são alimentadas e cuidadas pelo Guardião do Portão, que é um gigante. Durante o inverno, boa parte das bestas morrem, então suas caveiras são removidas e limpas para que seus sonhos sejam lidos. O narrador é o Leitor de Sonhos, o único que tem acesso às informações deixadas pelas bestas. Confortável que o narrador esteja com sua vida de Leitor de Sonhos, ele ainda deseja voltar para sua sombra e salvá-la, salvando sua própria mente, no entanto isso é proibido pelas leis do Fim do Mundo, que proíbe os moradores de terem sombras, saírem da cidade ou passarem muito tempo nas florestas.

Isso não fez o menos sentido, só que mais do que isso tiraria a graça de ler o livro e ir descobrindo aos poucos o que relaciona uma história com a outra e como as coisas se resolvem.

Em geral, é uma história do Haruki Murakami. Todos os ingredientes específicos dele estão aqui, mas acontece que, saídos do forno, o prato foi completamente diferente. Ou talvez tenha sido a mesma comida, mas com um sabor incomum. Aqui temos um personagem principal passivo e solitário, satisfeito com a própria vida, que se vê pego por algo maior que ele em circunstâncias que ele não consegue controlar. Como sempre nas histórias do Murakami, tem uma garota ali para guiá-lo nesse caminho novo e bizarro. No caso da linha narrativa de Hard-Boiled, tem duas. A garota gordinha (é o nome que o narrador dá pra ela), neta de dezessete anos do cientista, que só se veste de rosa e nunca sai do laboratório, mas, apesar do ambiente protegido em que cresceu, é muito mais forte do que parece; e a bibliotecária, a mulher por quem o narrador se apaixona, que tem um estômago sem fundo, estando sempre com fome e podendo comer o quanto quiser sem nunca engordar. Elas que cuidam do narrador em sua jornada. Já na linha do Fim do Mundo, existe apenas a bibliotecária (outra), nascida em Fim do Mundo, perdeu sua sombra e sua mente ainda criança. Acredita que sua mãe morreu ainda mantendo sua mente, mas não sabe ao certo. O narrador se apaixona por ela e fica tentado a largar sua sombra para viver com ela em Fim do Mundo.

Logo de cara uma coisa já se destaca. Uma das linhas narrativas é um suspense, fortemente inspirado na ficção científica da época (Blade Runner, a cultura do Cyberpunk, ainda recém-nascida nesses dias) e, obviamente, dos livros Hard-Boiled, com seus capangas de um terceiro partido que quer se meter no meio da briga entre o Sistema e a Fábrica, femmes fatales, conspirações que dizem que o Sistema e a Fábrica são controlados pela mesma pessoa, e mistérios complicados que nem sempre encontram explicação. A outra é muito mais próxima da fantasia e usa uma linguagem muito mais formal e descritiva que a outra linha narrativa. O tom é bem mais poético e contemplativo que a correria tecnológica de Hard-Boiled. No Fim do Mundo não há guerras, estão todos bem e iguais e é isso que enche o narrador de medo.

Não é necessário dizer que também há música e cultura pop. Se não houvesse, seria o livro de outro autor que eu estaria resenhando. Lógico que na linha narrativa do Fim do Mundo não tem cultura pop, mas Hard-Boiled é cheio. E uma das coisas que cativa o narrador em Fim do Mundo é a presença de instrumentos musicais perdidos, que ele não sabe exatamente o que são, mas gosta do som que eles emitem, não por ser bonito - ele não sabe tocar -, mas por ser algo que ele nunca ouviu antes.

A repetição dos temas nos livros do Murakami é um defeito, isso não tem como negar. Outro é o fato dos narradores dele serem tão passivos que é como se o enredo os pegasse pela mão e os puxasse pelos acontecimentos. Isso vai irritar alguns. Na verdade eu creio que toda a parcela da população de leitores que não gosta de Murakami não gosta por causa disso. Eu me identifico. Ler uma história do Murakami é quase sempre como ler uma história feita sob medida pra mim. Isso não é muito saudável pra um leitor, mas é difícil de evitar. Hard-Boiled talvez tenha os narradores menos passivos. Solitários, silenciosos, flexíveis, pode ser. Mas eles tomam controle da situação uma hora ou outra, o que pra mim foi uma novidade. Por isso digo que foi o livro mais diferente dele dentre os que eu li e só isso já valeu a leitura. 

Se você nunca leu Murakami, eu não diria pra começar por esse. Por mais que eu ache esse o melhor livro dele, as traduções americanas são de doer. A prosa não é ruim, mas a revisão é abaixo da média. Devia ter contado o número de erros gramaticais que eu, que apesar de ser fluente em inglês não tenho o idioma como língua materna, consegui pegar, mas o imbecil do editor deixou passar, só que depois de um tempo eu fui perdendo a conta. Só isso basta pra vocês entenderem que foram muitos. Isso vai desagradar. É uma pena que a Alfaguara não tenha planos pra lançar esse livro ainda. (Ei! Se algum funcionário da Alfaguara passar por aqui, anotem essa dica! Esse é um livro do Muraka que não pode faltar no acervo de vocês, viram? - vai que cola.) Então, vocês que não sabem nada do autor, vão ler Norwegian Wood. Fiquem longe dos livros americanos traduzidos pelo Alfred Birnbaum e olhem torto pra Wind-up Bird Chronicle, traduzido pelo Jay Rubin (esse a culpa é da editora americana que mandou cortar sei lá quantas páginas do livro e mudar a ordem de alguns capítulos - queria eu entender essas editoras que compram os direitos pra traduzir um livro, mas exigem que o tradutor o desfigure por completo...). Apesar disso tudo, Hard-Boiled esse se tornou meu livro favorito dele, eu acho. Tá bem ali ao lado de Norwegian Wood. Os dois tão quase empatados. Uma boa edição brasileira de Hard-Boiled pode desempatar.

Aqui o resultado do Murakami Bingo:
Acho que eu já falei que esse quadro é do Grant Snider, mas nunca joguei o site do cara aqui. Pronto: http://www.incidentalcomics.com/ - Podem passar lá, o cara tem umas tiras - que não são bem tiras, mas eu não sei o termo - excelentes. (Agora vocês me digam quantos blogs indicam duas coisas em uma resenha. O que seria de vocês sem mim?)
E a nota: 5/5

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Pequenos erros meus ou Quase um devir



Isso é uma série de aforismos meus que anoto às vezes no ônibus, outras vezes no chuveiro, na rua, enfim, organizei alguns antigos outros bem recentes, pois são vários e vários blocos de anotações (bem bagunçados, imaginem) e dependendo do meu tempo e coragem, talvez, eu deva organiza-los outra vez, ou quem sabe não. Vocês não aguentariam mais uma leva de besteiras minhas. Fiquem com os meus pensamentos.


1

A ressaca é a melhor forma de você se sentir vivo.

2
Quando alguma coisa do passado vier nos visitar, não se esqueça do presente.
3
O banheiro é o único ambiente que se entende a solidão.
4
No amor a loucura só não é usada durante o sexo, em todo o resto; usam em excesso.
5
Um porre serve para muitas coisas, mas a melhor delas é quando não serve para porra nenhuma.
6
O medo é quase sempre confundido com a covardia. O suicida não deixa de se suicidar quando vê altura da corda.
7
Lugar de aforismo é na lápide, ou na bunda de alguém.
8
Poema que ladra te morde.
9
O sábio nunca erra quando o assunto é ser caxias.
10
Perder te ensina várias coisas sobre a vida, mas ganhar não te ensina nada além.   
11
Às vezes me pego pensando: e si todas as minhas paixões adolescentes tivessem dado certo? Eu estaria escrevendo esse aforismo agora? Talvez não, estaria apenas escutando o Justin Bieber.
12
Ser estúpido ainda é a melhor forma de se ganhar uma discussão. Eu acho. Ah...
13
A coisa mais espirituosa que eu já ouvi alguém dizer: “ontem eu senti o mar, imagine o céu?”
14
Toda vez que saiu do supermercado tenho a sensação de estar sendo seguido pela sessão de frios.
15
O melhor conselho que um escritor já me deu foi para não seguir conselho de escritor nenhum.
16
Levei tantos foras das mulheres por ser feio e tímido, hoje continuo levando foras, mas agora é por ser um feio sincero.
17
O tempo muda só aquilo que acha que não irá mudar. Imagine se as pedras não pensam em virar estátua.
18
Você é tão linda e eu aqui imaginando isso agora, como se fosse acabar tua beleza um dia, mas você demora a se vestir. Aí. Eu começo a cochilar. Assim, nunca vamos sair para jantar. — Você ainda vai baby? — Diz ela sussurrando. Paro de escrever. — Já vou...
19
Os sonhos acabam porque continuamos dormindo.
20
A vida é breve, então, leve poesia.




OBS: Troquei os aforismos que faziam alguma referência política. Aí você pergunta por quê? Não sei onde estava com a cabeça para publicar essas máximas-humorísticas-políticas-istas-e-istas... Política é um assunto que quando começam a falar, prefiro me retirar (como se diz aqui no Ceará: peço para sair e vou cagar). É um assunto muito sério até para uma pessoa como eu que, ainda acredita na salvação da humanidade, mas sem demasias: quando publiquei e li os comentários me questionei —  realmente não tinha nada que falar de política. Disse um dos aforismos "políticos" a um amigo artista plástico e ele riu, mas disse o mesmo aforismo a um outro amigo militante e ele disse que falei merda. Eu havia feito uma pequena comparação com o pensamento de um e de outro, cheguei na conclusão inexata que, qualquer assunto ou coisa levado a sério de mais acaba se tornando algo indômito, porém, esse questionamento dúbil ainda é necessário, mas já falei de mais é melhor deixar quieto. Por isso, por favor, não me levem tão a sério.